19 de mai. de 2009

O outro lado do gume

“ ...isso tudo indica que não, não pode ser dúvida; é fuga. Você se acovarda ao não levar a questão adiante, a pensar sobre a possibilidade... Insiste em grafar com d minúsculo. E as suas oscilações? Ora considera... ora não... Acontecimentos são coincidências, acasos. Como se o fato de uma senhora que perdeu o avião, justamente no dia em que ele caiu, fosse obra do acaso. E contra-argumenta: ‘e os outros que morreram na queda, é obra de quem?’. Não considera o destino. Claro que existem mesmo questões sem resposta. Mas faz parte do mistério. Mistério é mistério, ora essa!; não há o que ficar filosofando... Lê a Bíblia de forma ‘literária’ com tantos livros realmente literários à disposição. Considera a dúvida, aquele papo de Descartes, Decart, Decartes... não sei nem pronunciar. E faz chiste: ‘se oro, creio’. Ora ora; ora não ora. Gostou do trocadilho? Só quando se sente em perigo... Ou quando está sem grana... E põe a própria oração em questão. Aí eu concordo: rezar de que forma se a primeira oração que vem à mente é uma Ave-Maria ou um Pai-Nosso? Herança de infância. Até rimou: herança...infância... Sua questão procede: como orar sem aderir a alguma corrente? Inventar uma oração alternativa, particular, isenta? Uma espécie de oração laica? Se bem que quando você andava lendo Santo Agostinho você ficou bem empolgado. Logo esmoreceu; aquele papo de que o maior talento do filósofo era a capacidade de narrar e argumentar - nada mais! Tornou-se até um dogma intelectual não admitir a transcendência, você notou? Vaidades... Aí entram também questões de direita e esquerda, marxismo, etc. - melhor nem entrar nesse ramo. Laico, laico, laico... Adora falar laico. Esse ceticismo inconstante acaba colocando minhocas na minha cabeça. Idolatra a arte, a arquitetura, a música, mas desdenha das procissões, dos pagadores de promessas, da 'lógica da punição': cento-e-vinte-orações, três-vezes-ao-dia, todos-os-dias-da-semana; domingo-o-dobro. Diz que basta uma oração, só uma!, para fazer o mesmo 'efeito'. Cada um faz o que quer da vida e acredita em quem quiser, com o perdão do clichê. E vou além: cada um dá o seu dinheiro a quem quiser. Mas 'lógica da punição', do sacrifício é mesmo perturbadora, tenho de admitir. Plantar agora para colher depois... outro clichê. [Silêncio] Muitos dos seus argumentos são lugares-comuns também. [Silêncio] E o seu silêncio? Acho que o seu silêncio é mais misterioso do que o próprio mistério, o ‘mistério final’, o outro lado - se é que ele existe. Agora até eu fiquei em... [Silêncio] E acho também que você se sente muito confortável com a dúvida. Você gosta da dúvida, de caminhar no gume. Mas é mais fuga do que..."

6 comentários:

  1. que texto bom, cara...

    os nossos silêncios internos realmente são perturbadores...

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  2. Jasão,

    Anda acordando cedo, hem!

    É isso mesmo: silêncio e dilemas internos...

    Agradeço a visita!
    abraço,well

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  3. oi,

    Wellington, vim aqui agradecer a visita ao Isso é Bossa Nova, afinal temos esses códigos de "ei,tudo bem? tudo e você?"
    Confessada a minha intenção inicial "tudo bem e você?", fico passada...
    silêncio é minha música predileta. Incomoda demais, mexe demais e a Pandora agradece:)
    Gostei de seu texto, extremamente inspirador. Silêncio. (to pensando numa frase de efeito)
    Gosta de arte ne? Eu adoro esse quadro do Chirico. Perturbador como são os momentos de silencio, ora. ;) (péssima pra piadas)
    Vou te linkar no IeBN tá?Pode?

    abs

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  4. Sandra,

    Agradeço sua visita aqui. Tomei conhecimento do seu blog através do blog "Não há pensamento raro", do amigo Jason.

    Claro que pode fazer o link deste humilde blog, que está ainda engatinhando. Também vou colocar o "Isso é bossa nova" aqui, se me permite.

    abraço,
    w.m.carvalho

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  5. Pelo amor de Deus, que ridículo esse texto! Pare com essa modernice tola!

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  6. Manuel Carreiro22 agosto, 2010

    Vai fazer um ano, algum imbecil passou por aqui e disse que esse texto era "modernice tola". Porque alguém de ocupa em ler um blog de que não gosta, pra mim, é um mistério...

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