2 de jun. de 2009

Não há verdade plena

Nunca conseguiremos atingir a verdade plena. E muito menos, por conseqüência, o conhecimento pleno. Todo o conhecimento racional acumulado desde os questionamentos pré-socráticos é falacioso. O máximo que conseguimos é chegar bem perto da verdade, mas nunca alcançá-la por completo.
No âmbito da comunicação, quando um interlocutor (A) profere uma frase/discurso (x) a outro interlocutor (B), está inserida ali (em x) uma intenção/experiência impossível de ser totalmente descrita em palavras. Quando A narra, com riqueza de detalhes, que degustou um vinho francês ou leu uma peça de Shakespeare, ou mesmo ouviu Chopin em uma tarde fria, não consegue, por mais que tente, transportar a sua experiência, seu paladar, seus arrepios, suas lágrimas a B, valendo-se de palavras – que é o meio de que dispomos para transmitir conhecimento ou verdades. O cavalo marrom de A, narrado a B, nunca será o mesmo para este. Na transferência de discursos, criamos quase-verdades.
Um leitor A, ao ler um livro, cria em sua mente uma história diferente da criada por B, que difere de C, de D, etc. Milhares de pessoas leram o mesmo livro e imaginaram milhares de histórias diferentes. Todas também distintas da história real, que é a do próprio autor.
Muitas são as intenções por trás das palavras – e isso pode ser a razão de muitos mal-entendidos, além das quase-verdades. Um simples elogio de A, se não for bem retratado, pode transmitir a B tanto um discurso neutro e insosso, como (até) soar como crítica. Neste caso, é como se existisse um paradoxo da boa intenção: quando se tenta dizer mais, entende-se menos.
A palavra é tão carente de significado pleno que, sempre que podemos, tentamos aliar algum outro tipo de percepção (observamos as feições do falante, seus gestos, etc.) como complemento no ato do proferimento do discurso. As trocas de mensagens na internet reforçam a tese. Quantas vezes tivemos de nos retratar, de explicar melhor uma mensagem enviada ou um comentário que foi mal interpretado do outro lado da tela? Quem lê texto (palavras) não vê feições nem gestos. Vai daí a proliferação das carinhas (emotions) para completar nosso discurso. O corpo fala (há até um livro) porque as palavras não bastam.
O que há realmente de verdadeiro é o que está em nossa mente; cada um com a sua. Toda tentativa de exteriorização dessas verdades tornam-nas quase-verdades. O maior mérito de quem se propõe a refletir sobre tudo – e isso é a razão da real existência, creio - é a insistência em perseguir a verdade plena (mesmo ciente desta impossibilidade) e enxergar luzes no simulacro que é o mundo.